Mastodon: boas práticas de design e administração em comunidades online descentralizadas

Lesandro Ponciano

04 de maio de 2023

Como comentei anteriormente, tenho usado instâncias do Mastodon. As principais instâncias que tenho acompanhado são mastodon.social e bolha.us. Foi um processo gradativo. Criei contas em algumas instâncias no ano passado. Este ano comecei a usar o recurso “explorar” para ver o que tem sido publicado. Segui algumas contas interessantes. Publiquei uma introdução, que é uma boa prática quando se cria uma conta em uma instância. Porém, tenho observado mais do que atuado.

Notei que Mastodon traz de volta uma série de coisas que eu gostava na internet e que estavam bastante sumidas com o advento das bigtechs e seus grandes sistemas centralizados. Três dessas coisas são: 1. característica de cada instância como uma “comunidade”; 2. descentralização, com cada instância da federação funcionando como unidade autônoma; 3. ênfase real nas hashtags.

Cada instância é uma comunidade. Isso é nítido em instâncias que agregam apenas algumas centenas ou pouco milhares de pessoas (como bolha.us). A prática de se “apresentar” publicando uma “introdução” quando se chega a uma instância é bastante característica de comunidades. Há instâncias com regras bastante rígidas sobre o tipo de conteúdo que você pode publicar. Esse é o caso do fosstodon.org, que define conteúdo em inglês e sobre tecnologia, em particular, sobre software livre. Há instâncias que não permitem publicação de conteúdo de modo automatizado (exemplo: scholar.social), enquanto outras são abertas para isso (exemplo: botsin.space). Cada instância tem suas características. Há diversas listas com centenas de instâncias, veja esta lista joinmastodon.org/servers. É fácil encontrar na internet relatos de pessoas que foram banidas por não seguirem as regras da instância. A dinâmica administrativa das instâncias se assemelha ao que se via nas comunidades online e nos fóruns que eram comuns nos anos 2000.

Fica claro que cada instância é uma unidade autônoma dentro de uma federação. Por exemplo, não há relação administrativa direta entre bolha.us e fosstodon.org. Mas elas são parte de uma mesma federação. A federação é um conjunto de instâncias que usam a mesma plataforma de software, no caso, Mastodon. Estando em uma instância, pode-se seguir pessoas que estão em outras instâncias da federação e pesquisar conteúdos publicados em qualquer lugar da federação. Pode-se também republicar (ou reblogar, semelhante ao retweet) conteúdo publicado em qualquer outra instância. Pode-se também migrar toda a conta (com publicações e seguidores) de uma instância para outra. Vejo as instâncias de modo semelhante à forma como eu via as comunidades Bittorrent no passado.

As hashtags têm um papel extremamente importante na dinâmica do Mastodon. Não é simplesmente uma marcação que permite acesso rápido a outras publicações com a mesma marcação. Uma página é gerada na instância para cada hashtag. Pode-se seguir uma hashtag, como se segue uma conta. Assim, recebe-se no feed todas as publicações feitas na instância e que possuem aquela hashtag. Isso pode ter efeitos na dinâmica de uso de hashtags no sistema, pois há a característica de um “tópico de interesse”, que é muito mais do que simplesmente um tópico de destaque. Essa forma de uso de hashtags se assemelha muito aos antigos collaborative tagging systems.

Esses são apenas alguns exemplos para mostrar que é uma dinâmica de interação em rede social bastante sofisticada. Ela recontextualiza e agrega elementos de design e de administração de comunidades que existiam em diversos sistemas descentralizados do passado e que foram abandonados com o monopólio dos sistemas centralizados. Minha conclusão é que vale a pena usar e observar o que acontece no Mastodon.

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